Na cruzada para viabilizar a produção de campos de menor
porte, as companhias de petróleo passaram a lançar mão de subsea
tiebacks – modalidade de projeto que interliga um reservatório
a uma plataforma já em operação, reduzindo os investimentos
que seriam necessários para a instalação de uma unidade dedicada
e antecipando a extração do primeiro óleo.
O empenho se concentra agora em alcançar reservatórios
mais distantes – precavendo que as baixas temperaturas do fundo
do mar congelem o petróleo e o gás e entupam as linhas que
interligam o reservatório e a plataforma. Via de regra, as operadoras
utilizam aquecimento elétrico ativo para manter a temperatura
dos risers e evitar a formação das parafi nas e hidratos, loops
e até linhas duplas. “Os desafi os técnicos variam de acordo com
as características de cada projeto. No entanto, em termos gerais,
o desafi o contínuo se confi gura em permitir a implementação de
tie-backs cada vez mais longos sob a ótica técnica, assim como
aumentar sua atratividade econômica”, conta o gerente geral de
Engenharia Submarina da Petrobras, Felipe Matoso.
Representantes da TechnipFMC e da Subsea 7 apresentaram,
em um painel realizado durante a Brasil Offshore, alternativas
para garantir o fl uxo do petróleo e do gás. A primeira vem trabalhando
com Petrobras, Total e Sulzer no desenvolvimento de um
motor submarino de alta tensão para prover energia aos sistemas
de bombeamento. A Subsea 7 tem o Electrically Heated Trace
Flowline, um pipe in pipe aquecido, já qualifi cado, e agora pesquisa
a tecnologia Cold Flow, de escoamento a frio.
Um estudo de viabilidade econômica feito para o Mar do Barents
indicou como ponto de economicidade da tecnologia Cold
Flow distâncias superiores a 70 km – abaixo disso, o aquecimento
elétrico seria a alternativa mais econômica, devido a quantidade
de equipamentos agregados.
O Electrically Heat Traced Flowline - EHTF possui uma estrutura
mais complexa que o aquecimento elétrico direto - DEH. Como
contrapartida, é mais efi ciente e capaz de suportar condições mais
severas. Os fi os são traçados em trios no espaço anular entre os dois
tubos, e por efeito joule mantem o duto aquecido – a potência elétrica
pode ser fornecida por um umbilical conectado no topo ou em
algum outro ponto da linha. O espaço dentro do pipe in pipe ainda
é preenchido com isolamento de base polimérica em tecnologia nanogel
desenvolvida pela InTerPipe – no vácuo criado nesse espaço
anular as moléculas não conseguem vibrar e transmitir calor, o que
reduz o consumo de energia. “O vácuo potencializa esse isolamento.
Com essa característica conseguimos tempos de permanência
em uma determinada temperatura três vezes superior”, afi rmou o
gerente sênior de Tecnologia da Subsea 7, Ivan Cruz.
O diferencial reside na capacidade para alcançar maiores distâncias
– o limite do aquecimento elétrico ativo está diretamente relacionado
ao suprimento potência elétrica a longas distâncias. Com
a linha aquecida, tanto o petróleo ou o gás quanto os produtos químicos
conseguem fl uir com mais facilidade. Outra vantagem desse
sistema é permitir o redimensionamento das bombas submarinas
– com a manutenção da temperatura, menos esforço é necessário
para escoar o petróleo. A Subsea Integration Alliance – grupo que
reúne OneSubsea, Schlumberger e Subsea 7 – estuda a integração
do EHTF com sistemas de bombeamento. A ideia é que a essa solução
dispense a adoção de bombas mais complexas e compartilhe o
mesmo umbilical para suprimento de potência demandada.
A tecnologia Cold Flow propõe o contrário: deixar o petróleo
e o gás escoarem a baixas temperaturas, e concentrar o esforço no
gerenciamento da formação de parafi nas e hidratos. Na unidade de
processamento submarino o petróleo é separado da água e do gás
e em seguida resfriado em outra unidade para seguir seu caminho
até a plataforma. Dentro dessas linhas, um pig circula em loops,
raspando a parafi na depositada nas paredes do duto, e o sistema
de bombeio se encarrega de levar a parafi na embora. “Isso vai se
tornar interessante à medida em que as distâncias nas quais você
quer escoar esse fl uido por um duto singelo compensam o esforço
necessário para gerenciar a formação de parafi na ou hidrato no
início do escoamento da produção”, enfatiza Ivan Cruz.
O motor de alta tensão desenvolvido pela TechnipFMC com
a Petrobras, Total e Sulzer já está qualifi cado. A proposta do projeto
é levar para o fundo do mar um motor de 13.6 kV e tomar
cabos umbilicais de menor bitola – já que o motor de alta tensão
demanda menos corrente para a mesma potência.
Usualmente o suprimento de equipamentos submarinos exige
complexos sistemas de potência – formados por geradores, barramentos,
disjuntores, variadores de frequência, umbilical, placas de
terminação, penetradores e conectores. Tudo isso representa custo
maior. A tensão típica de um motor submarino – 6.6 kV – também
é um limite para a distância do subsea tieback. O maior umbilical
qualifi cado pela Petrobras (de 240 mm², utilizado para alimentar o
separador submarino instalado no campo de Marlim, na Bacia de
Campos) está apto a suprir 2.2 MW a um equipamento localizado
até 10 km – para além dessa distância, as perdas de potência excluem
essa opção. Aumentar a sessão do umbilical, por outro lado,
traria poucos benefícios em relação aos custos – um cabo de 300
mm², por exemplo, aumenta para 2.4 MW a potência e para 27 km
a distância alcançada.
Teoricamente, o mesmo resultado – aumentar a tensão
e reduzir a potência – pode ser obtido com a inclusão de um
transformador na plataforma e outro no fundo do mar. Só que
transformadores submarinos e seus conectores representam um
considerável aumento do investimento. A alternativa proposta
é instalar no fundo do mar um motor com a mesma tensão da
plataforma – os parceiros desenvolveram esse motor usando a
tecnologia de imã permanente, que apresentou maior efi ciência
e permitiu trabalhar com fl uido de barreira baseado em água.
“Sistemas elétricos impactam o Capex, especialmente para subsea
tieback de longa distância. A redução da complexidade e do
custo vai determinar a atratividade do sistema de bombeamento”,
explicou o diretor de Subsea Processing da TechnipFMC,
Eduardo Cardoso.
Solução para campos marginais
A Shell passou a esquadrinhar seus novos projetos subsea
tieback dentro do programa batizado de Competitive Scoping
– criado para adequar os custos ao novo patamar de preços do
barril, esse procedimento estabelece que o design de um projeto
deve ser direcionado para garantir um desempenho mínimo
aceitável, agregando apenas o que aumente o seu valor. O melhor
exemplo está no projeto de Kaikias – campo em fase de
desenvolvimento em águas profundas do Golfo do México. Os
três poços são interligados a um production line end manifold
- plem, que enviará a produção de petróleo e gás até a plataforma
de Ursa através de uma single fl owline de 16 km – e não mais por
uma linha dupla. A redução na quantidade de equipamentos – e
na demanda de energia – admitiu um umbilical de menor sessão.
A simplifi cação reduziu pela metade o investimento estimado
inicialmente. Caso seja necessário desobstruir a linha por entupimento
com parafi nas ou hidratos, esse plem está preparado para
receber um lançador de pig. Ainda assim, a sequência de start up
em cada um dos poços foi desenhada para evitar o resfriamento
do fl uido – essa estratégia só foi possível por conta do profundo
conhecimento das características do petróleo de Kaikias.
A petroleira acumula experiência com tiebacks de longa distância.
É dela a operação do projeto subsea to shore de Ormen
Lange, no mar do Norte – esse campo de gás dista 100 km da
costa da Noruega – e de alguns reservatórios de petróleo no Golfo
do México interligados a plataformas a 30 km. Usualmente
eles foram projetados de forma conservadora, centrada na prevenção
e na redundância.
À plataforma de Nakika, em operação desde 2003 no Golfo
do México, estão interligados seis reservatórios, com distâncias
que variam de 8 km a 42 km e profundidades de 1.770 metros
até 2320 metros. O projeto foi desenhado com dual loops pipe in
pipe – em alguns casos com aquecimento ativo elétrico – mais
inline tee e árvores de natal. As difi culdades desse projeto vão
além das baixas temperaturas dos reservatórios. Os campos de
Ariel e Kepler, na parte norte da área, estão localizados em um
declive – como isso estimula a formação de slug, gás lifting foi
inserido na arquitetura subsea. Para longos shutdowns, o método
primário adotado foi o displacement dead oil. Conectores foram
instalados ao longo do anel de coleta para elevar a temperatura
caso ocorra a formação de hidratos. No campo de Europa, também
no Golfo do México, o manifold está conectado à TLP de
Mars, distante 32 km, por duas linhas com isolamento pipe in
pipe. Caso haja algum problema, o petróleo segue por uma linha
enquanto a outra é despressurizada.
O campo de Julia, operado pela Exxon Mobil em águas profundas
do Golfo do México, escoa a produção para a plataforma
da Chevron na área de Jack e St. Malo, distante 24 km. Os seis
poços e o manifold estão interligados por duas linhas com dois
steel catenary risers e dois módulos de bombas subsea.
A Petrobras também tem experiência com tiebacks no Golfo
do México: o campo de Chinook está interligado ao FPSO
Pioneer, distante 21 km. É a distância média de outros projetos
tieback instalados no offshore brasileiro: na Bacia do Espírito
Santo, o campo de gás de Canapú está interligado ao FPSO
Cidade de Vitória, no campo de Golfi nho, a 20 km, e na Bacia
de Santos o campo de Mexilhão dista 21 km da plataforma
PMXL-1. O marco da Petrobras está registrado no campo de
Marlim Sul, na Bacia de Campos, interligado à plataforma P-
20, a 19 km – nem tanto pela distância, mas por ser o poço
Marlim-4 o primeiro do mundo a iniciar a produção em profundidade
superior à 1.000 metros. A estratégia adotada em
cada projeto depende da composição do fl uido, profundidade,
características do reservatório e distância do tieback. “Estas
soluções incluem tipicamente o uso de isolamento térmico,
a adoção de inibidores, assim como a elaboração de diversos
procedimentos operacionais para a prevenção e remediação de
obstruções por hidratos e parafi na”, relata Felipe Matoso.
Na atual carteira de projetos da Petrobras não há novos tiebacks
previstos – apenas em análise.
Subsea tieback tem entre os seus predicados ser uma solução
menos intensiva em capital para o desenvolvimento de campos
menos atrativos – em alguns casos, essa modalidade representa
até metade dos custos da instalação de uma plataforma dedicada
– especialmente quando há uma infraestrutura de produção próxima
para compartilhar a capacidade de produção. “Uma unidade
de produção fl utuante pode representar até 40% do custo geral de
desenvolvimento. Quando ela é removida e o sistema submarino
é redimensionado para tieback, a companhia busca uma fração
dos gastos. No entanto, é importante ter em mente que o tamanho
do projeto tieback também tem potencial para ser uma fração
do conceito autônomo”, ressalta a diretora de Pesquisa da Wood
Mackenzie para Upstream Supply Chain, Caitlin Shaw.
Há, porém, uma difi culdade em quantifi car o número de
projetos tiebacks implementados – a consultora da Wood Mackenzie
explica que, ao contrário dos planos mais intensivos em
capital, esses projetos nem sempre são divulgados pelas companhias.
Ainda assim, ela e outras fi rmas consultorias acreditam no
aumento nessa modalidade de projeto, sobretudo diante do rigor
com que a viabilidade econômica dos empreendimentos passou
a ser avaliada após a retração no preço do petróleo. Isso não signifi
ca que o subsea tieback seja uma solução possível para extrair
o petróleo e o gás de qualquer reservatório. A capacidade ociosa
em uma plataforma próxima é o primeiro desafi o – e, quando se
considera o compartilhamento de instalações de outra operadora,
entra na equação um nível adicional de planejamento e negociação.
Há ainda a falta de experiência de alguns operadores na
execução de tiebacks. “Enquanto está na superfície, pode parecer
fácil executar um subsea tieback com três poços se você for um
especialista, mas há desafi os culturais associados a mudar para
um conceito de desenvolvimento relativamente desconhecido”,
fi naliza Caitlin.
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