A vida útil média de um tambor de coque – equipamento
da unidade que processa as frações residuais do refi no de
petróleo – gira em torno de 20 anos. Sua substituição é
uma operação trabalhosa e cara. Há nove anos a Petrobras teve
que trocar o tambor de uma unidade de coqueamento da Refi -
naria Presidente Bernardes. A operação levou 30 dias e custou
R$ 15 milhões. A companhia teria gasto o mesmo na Reduc e na
Regap se seus pesquisadores não tivessem utilizado uma técnica
de soldagem para recompor a estrutura do equipamento. Com
a solda overlay, o desgaste e as deformações do tambor foram
corrigidos com depósitos de solda. Descrita assim, a operação
até parece simples. Mas exige cálculos complexos.
“Ao invés de substituir o equipamento, aplicamos um determinado
revestimento para estender sua vida útil. Tem alguns
exemplos dessa natureza. Estamos, o tempo todo, olhando o ciclo
de vida do ativo, desde o início da operação até o momento
em que ele é desativado por fi m de vida útil”, conta o gerente
de Tecnologia de Manutenção da Área de Refi no da Petrobras,
Henrique Ventura.
Na ponta do lápis, vale mais a pena prevenir a quebra do que
reparar um equipamento – desde que esse aforismo foi adotado
pelos departamentos de manutenção, as empresas passaram a investir
mais em gestão dos ativos. E essa gestão pode impactar
positivamente na disponibilidade de equipamentos e, por consequência,
no resultado operacional das unidades fabris.
30 anos atrás uma unidade de craqueamento catalítico operava
por dois anos – no máximo dois anos e meio. Hoje uma
unidade opera por cinco anos. “Houve um grande avanço nos
materiais, principalmente dos refratários. Investiu-se muito, de
modo a tornar o hardware mais robusto. E, com o avanço da instrumentação
e da automação, as unidades hoje são muito mais
monitoradas do que no passado, o que permite operar totalmente
dentro dos parâmetros em que foram projetadas”, explica Ventura.
Cada uma dessas evoluções foi útil – separadas, elas pouco
teriam a contribuir para esse salto. Não basta ser construído com
materiais mais resistentes às altas temperaturas e pressões. O
equipamento deve ser operado dentro dos limites em que foi projetado.
Fora dessa faixa, ele se degrada mais rapidamente. Mas
não basta monitorar apenas a operação. O próprio equipamento
também tem que ser monitorado – com sensores de pressão,
temperatura e vibração e um potente sistema que processe todas
as informações. É a partir dessas informações que é possível estender
o tempo de operação de uma unidade mantendo controle
sobre os riscos.
Há 30 anos não era tão fácil fazer esse tipo de manutenção
preditiva – que prediz o tempo de vida útil das máquinas e equipamentos.
Por estatística, os técnicos interrompiam a operação
para fazer a manutenção preventiva – aquela intervenção programada
antes da data provável de uma falha. O maior desafi o era
acertar o prazo certo dessa intervenção.
Uma pesquisa realizada pela DNV GL com mais de 900 profi
ssionais do setor de petróleo e gás colocou a tecnologia de sensores,
a automação e operação remota entre as que poderiam ter
o maior impacto. “Big data and analytics” e “internet of things
/smart technology” aparecem apenas em quinto lugar, juntamente
com recuperação avançada.
Um aplicativo do sistema de gerenciamento de ativos já auxiliou
os técnicos da Braskem na decisão entre retirar uma válvula
para manutenção ou fazer os reparos sem removê-la. A mesma
ferramenta também permitiu reduzir as perdas de matéria prima
na fábrica de polipropileno de Paulínia / SP, após identifi car um
desvio de curso em uma válvula de alívio. O sistema de gerenciamento
de ativos está conectado com 470 instrumentos e 19
equipamentos rotativos com monitoramento de vibração e deslocamento
relativo. Técnicos da Área de Automação utilizam as
informações para confi guração e parametrização de instrumentos
e backup de confi gurações. As Áreas de Operação, Manutenção
e Planejamento utilizam os relatórios para defi nir prioridades e
ações para tratamento dos alertas. O sistema de gerenciamento
de ativos instalado na unidade de Paulínia é considerado modelo
dentro da empresa.
Para elevar as unidades localizadas no polo do ABC / SP ao
mesmo patamar, as equipes de Confi abilidade têm como tarefa
defi nir um padrão de confi guração para os instrumentos de
campo e as equipes de Automação introduzir os parâmetros ao
sistema. “Se pegarmos um instrumento utilizado há 20 anos, a
folha de dados traz basicamente informações do processo e outros
dados específi cos. Hoje, além dessas informações, há pelo
menos mais 17 páginas com parâmetros”, observa o coordenador
da área de Automação das Unidades de Polímeros da região Sudeste,
Rogério Maesi.
Pit stop
É também por uma conjunção de tecnologias que uma parada
programada de manutenção de uma unidade de craqueamento
catalítico (unidade com foco na geração de gasolina) consegue
ser realizada em 35 dias – há três décadas, essa mesma parada
de manutenção não era feita em menos de 45 dias. As modernas
máquinas para elevação de carga e elevadores industriais
trazem ganhos de produtividade, o uso de ar condicionado para
refrigerar o interior dos equipamentos reduz o stress térmico dos
operários, e as ferramentas pneumáticas e hidráulicas agilizam a
abertura e fechamento de fl anges. “A mecanização das atividades
de manutenção nos ajuda a melhorar a produtividade e as questões
de segurança. Há 30 anos, era comum convivermos com 20
a 25 acidentes envolvendo 3 mil pessoas. Hoje trabalhamos com
1,5 mil a 2 mil pessoas e passamos várias paradas sem nenhum
acidente”, destaca o gerente da Petrobras.
Em outubro, a Braskem fará uma parada de manutenção em
um dos trens da unidade de insumos básicos de Camaçari / BA.
Pela primeira vez será utilizada uma técnica para a limpeza de
feixes de trocadores com ultrassom. Imersas em um tanque com
transdutores ultrassônicos e uma solução química, as peças são
limpas pela ação mecânica da implosão de microbolhas induzidas
pela aplicação do ultrassom. A limpeza convencional é feita
com hidrojato de alta pressão. O uso do ultrassom, além de
melhorar a qualidade, reduz o tempo gasto e a exposição das
pessoas a riscos.
A empresa já experimentou outras inovações na parada de
manutenção da unidade de insumos básicos de Triunfo / RS, há
dois anos – o uso de gruas de cargas fi xas no lugar de guindastes
móveis reduziu o custo global dos equipamentos e o tempo para
preparação de movimentação, e o saca-feixe autopropelido, que combina as funções de saca-feixe, máquina de carga para remoção
do feixe de trocadores e caminhão para transporte do feixe para
área de hidrojato, agilizou as tarefas. Outras duas ganharam a simpatia
dos técnicos de manutenção da Braskem, e são utilizadas não
só nas paradas, mas também em serviços rotineiros – é o caso da
inspeção de equipamentos com câmera PTZ (uma câmera especial
de alta resolução que alcança áreas inacessíveis de equipamentos e
viabiliza inspeções não intrusivas) e o uso de hidrojato com cabeçote
rotativo 3D, conhecido como bailarina, para limpeza de torres
sem que seja necessário desmontar as bandejas.
Avanços também são possíveis com mudanças na forma de
contratar os serviços – para esta parada, por exemplo, a Braskem
comprou um lote de tubos para trocadores de calor que necessitam
ser substituídos. Os feixes retirados serão recuperados fora do período
da parada, distante das pressões, reduzindo os gastos. A contratação
dos serviços de caldeiraria foi dividida por sistema operacional
– no formato tradicional, os serviços eram contratados para
cada tipo de equipamento. Com isso, além de reduzir os tempos
perdidos em deslocamentos de equipes para regiões mais distantes
da planta, a conclusão dos serviços em um sistema operacional
evita atrasos na liberação para a operação – antes, os sistemas só
eram liberados quando todas as prestadoras de serviço concluíam
as tarefas. Os serviços foram divididos em pacotes menores, priorizando
as empresas com contratos da rotina. “Essa prática leva a
melhor controle e qualidade dos serviços e menores custos, devido
à redução da necessidade de mobilização”, destaca o engenheiro
sênior de manutenção da Braskem, Carlos Henrique Schulz.
A Braskem não divulga o gasto exato da parada de manutenção
na unidade de Camaçari. O montante está calculado na
categoria de investimentos operacionais – que inclui manutenção,
produtividade, SSMA, paradas e efi ciência operacional, e
este ano soma R$ 1.595 milhões. No ano passado, sem parada
de manutenção, a empresa gastou R$ 960 milhões. O orçamento
anual das 13 refi narias da Petrobras gira em torno de R$ 2 bilhões
– aproximadamente metade desse valor é gasto com as paradas,
R$ 700 milhões com rotinas de manutenção e R$ 350 milhões
com melhorias operacionais.
Foco na manutenção
Diante da retração de investimentos em novos projetos, as
atenções dos fornecedores de equipamentos têm se voltado à demanda
por serviços de manutenção e integridade. O diretor geral
da Ashcroft no Brasil, Mario Filippetti, viu um aumento
nas vendas de produtos para reposição. A empresa,
que produz instrumentos para medição de pressão,
desenvolveu um sistema para manutenção de instrumentos
que reduz os custos em aproximadamente 50%
em comparação com os sistemas convencionais. Esse
sistema foi desenvolvido pela Ashcroft em parceria
com uma dezena de empresas – duas delas brasileiras,
do setor petroquímico. “O indicador mais contundente
é a redução de consumo anual de instrumentação nas
empresas brasileiras, que em uma planta petroquímica
chegou a cinco vezes desde que foi implementado, e a
dez vezes na outra empresa”, afi rma Filippetti.
Durante a conferência para usuários brasileiros,
a National Instruments apresentou a nova versão do
software InsightCM Enterprise, solução que ajuda a lidar com a
variedade de sensores, os requisitos de velocidade das medições
e o grande volumes de dados analógicos.
A fabricante de válvulas YGB destacou uma equipe de engenheiros
de aplicação para atender a demanda por serviços. A
empresa notou que, em função de pouca verba liberada para aquisições
de válvulas novas, as indústrias optam por recuperar as válvulas
em operação. “Temos um produto consolidado de mais de 25
anos, em várias aplicações com excelente performance. E isto tem
feito da YGB uma empresa de customização de soluções”, conta o
gestor de Execução da YGB, Marcos Cesar Benfatti.
“Apesar da crise atual no que se refere a novos empreendimentos,
as plantas industriais existentes precisam ser mantidas e
cuidadas de forma a poderem produzir com qualidade e segurança”,
completa o presidente da Presys, Vinicius Nunes. A empresa
produz equipamentos e software para calibração de instrumentos,
desenvolvidos com funções automatizadas para a aquisição
de dados – um dos destaques para o segmento é a PSV Station,
uma estação de teste e calibração de válvulas de segurança que
realiza os testes automáticos suportados por software que fazem
a aquisição dos dados e emitem o certifi cado de forma integrada,
evitando erros de digitação. Agora a Presys está desenvolvendo
sistema de calibração que utiliza conceitos de visão artifi cial para
reduzir o tempo dos serviços e aumentar a confi abilidade.
Em operação, o desgaste dos equipamentos é inevitável. Pela
legislação, a cada seis anos as unidades industriais precisam parar
a operação, desmontar tudo, limpar, trocar o que for preciso
e montar novamente. Esse trabalho começa a ser planejado
dois anos antes, com a defi nição dos serviços. Carlos Henrique
Schulz, da Braskem, lembra que a revisão da norma NR-13 – que
trata de gestão da integridade estrutural de caldeiras, vasos de
pressão e agora tubulações de interligação – publicada há dois
anos, eliminou a necessidade de teste de pressão periódico – hoje
eles só são feitos quando há reparos executados ou quando são
recomendados pelo Profi ssional Habilitado. E ainda modifi cou
algumas responsabilidades e atribuições dos Profi ssionais Habilitados
– uma das consequências foi abrir a possibilidade de determinação
de ensaios alternativos, como a utilização da câmera
PTZ para realização de inspeção de alguns equipamentos.
As estatísticas tabuladas pela Associação Brasileira de Manutenção
– que englobam outras indústrias além da petroquímica
– apontam um grande espaço para os métodos preditivos. A disponibilidade
do parque fabril é de 88,7%. Do tempo
em que elas estão paradas, 6,32% acontece por manutenção
e 5% por outros fatores. O Documento Nacional,
elaborado pela entidade, também mostra que
a idade média dos equipamentos é de 19,7 anos.
Os engenheiros de manutenção costumam usar
a fi gura de uma banheira para apontar as taxas de
falhas durante a vida útil de um equipamento: o
maior número delas se concentra no início e no fi m
da vida. O desafi o é aumentar o tamanho dessa banheira,
ou seja, estender o intervalo entre o início e o
fi m da vida do equipamento. “Se não fosse o homem
da manutenção, a curva da banheira nem existiria,
porque em pouco tempo o equipamento começaria a
degradar”, fi naliza Ventura, da Petrobras. |