Quando os índices do canal de São Francisco, no Rio de Janeiro, estão baixos, a maré avan- ça pela foz e o índice de salinidade do canal
ultrapassa os níveis tolerados pelos equipamentos da
Fábrica Carioca de Catalisadores. Nessas situações, a
empresa tem que interromper a captação de água. Sem
água, sem produção. O problema já se arrasta desde o
ano passado. Para contorná-lo, a Associação das Empresas do Distrito Industrial de Santa Cruz chegou a
construir uma soleira submersa para evitar a entrada
da água do mar no canal. Agora as indústrias decidiram captar água através de adutora única, localizada
em um ponto do canal onde a maré não chegue.
No ano passado, a queda na vazão do rio Atibaia
forçou a Rhodia interromper a operação no complexo
de Paulínia / SP. A empresa reprogramou a produção e
os estoques em função da disponibilidade de água. O
stress hídrico das grandes metrópoles já deu seus sinais,
e forçou mudanças na rotina do setor industrial. FCC
e Rhodia estão localizadas em regiões onde o sistema
de abastecimento não consegue mais atender a demanda. A situação identificada pela Agência Nacional de
Águas não é diferente nas áreas onde estão instalados
os principais complexos petroquímicos do país.
Para fabricar uma tonelada de um produto químico, as indústrias brasileiras precisam captar, em
média, 4,83 mil litros de água. Pode não ser muito quando comparado com outros usos – a produ-
ção de celulose consome cerca de 30 mil litros por
tonelada. Mas essa equação já foi maior. As empresas adotaram alternativas para combater as perdas
por vazamentos e evaporação, aproveitar a água da
chuva e reutilizar e os efluentes que eram descartados. Recentemente a Associação Brasileira da Indústria Química desenvolveu um guia para elaboração
de Plano de Contingência para a Crise Hídrica –
nele estão sugestões para enfrentar casos de contingência.
Um dos capítulos do relatório “Governança dos
Recursos Hídricos no Brasil, elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, se dedica a mostrar que a água
tornou-se um fator limitante para o desenvolvimento
do Brasil. Para tirar melhor proveito dos recursos hídricos – que embora abundantes, estão distribuídos
desigualmente – o relatório aponta a necessidade de
ganhos de eficiência e conservação. Os problemas de
abastecimento descritos no início dessa reportagem realçam que a água não está disponível onde mais
se precisa. Na pior das hipóteses, a escassez forçaria
a redução da produção e ganharia ainda mais peso
na decisão sobre novos investimentos. “Processos
mais eficientes começam a ganhar importância, porque a água cria um limite para o crescimento, tanto
populacional quanto industrial”, afirma o engenheiro
William Padilha, da Wherle, uma empresa alemã especializada em tratamento de efluentes.
O risco não preocupa apenas a indústria brasileira.
Pesquisa realizada no Fórum Econômico Mundial no
início de 2015 apontou que a crise da água pode gerar
mais impacto no mundo do que qualquer questão econômica. Se o aumento de produção continuar de mãos
dadas com o aumento no consumo de recursos naturais, a escassez de água – e também o aquecimento
global – imporá limites ao crescimento econômico. A
Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida
– INDC que o Brasil levou à COP-21 – a 21ª reunião
da Conferência das Partes – limita as emissões de gases de efeito estufa a 1,28 Gt de CO
2e em 2025. É uma
meta factível, considerando que em 2005 foram emitidas 2,04 Gt e em 2012 – último levantamento oficial
disponível – 1,2 Gt. Mas até 2030 deverá cair para
1,16 Gt. Para alcançá-la, o Brasil propõe aumentar em
cerca de 10% a eficiência energética e garantir a fatia
de 45% de fontes renováveis na matriz energética.
A escassez de chuvas, que reduziu o nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas, pode tornar o desafio bem mais complexo. Para atender a demanda, as
usinas termelétricas têm operado a plena carga, aumentando a queima de combustíveis fósseis.
A solução passaria, então, por inovação tecnológica e eficiência energética. Todos os países signatários
da Convenção – Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima – UNFCCC concordaram em assinar
um tratado para reduzir as emissões de gases de efeito
estufa. Não há divergência de que o CO2 produzido
pela queima de combustíveis fósseis e desmatamento
é a principal causa do aumento da temperatura média do planeta. As próprias petroleiras concordam na
precificação de carbono como ferramenta para reduzir
emissões.
A economia de baixo carbono é um caminho sem
ponto de chegada – mas também sem volta. “O desenvolvimento econômico em direção a uma economia descarbonizada é um processo irreversível. Ele já está acontecendo e vai se intensificar ao longo dos anos. Mas é
preciso que a população também tenha consciência desses novos parâmetros que vão ser incorporados a nossa
vida”, ressalta o diretor titular do Departamento de Meio
Ambiente da Fiesp, Nelson Pereira dos Reis.
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