Revista Petro & Química
Edição 377 • 2018

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Matéria de Capa
Integridade das instalações e gestão de riscos: multidisciplinaridade protege a vida, a propriedade e o meio ambiente
 
 
 

Segurança, sustentabilidade e efi ciência de sistemas são disciplinas presentes na operação de plantas industriais no geral, mas, que no setor de química e petroquímica agregam-se à gestão da integridade das instalações, dos equipamentos e dos negócios, entre outros pontos, com a fi nalidade de reduzir os riscos e garantir a preservação da vida humana, do meio ambiente global e da própria companhia, viabilizando as próximas gerações.

E risco é uma parte vital, seja no gerenciamento de informação na área financeira – para questões de investimento ou seguros -, seja no gerenciamento de ativos industriais.

 
Fernando Lescovar Neto – engenheiro naval, pós-graduado em engenharia de soldagem e em gestão pela FGV, profi ssional habilitado em NR- 13 e diretor técnico da SGS do Brasil – comenta que, no caso específi co de plantas industriais dos setores químico e petroquímico, os fl uidos originários do setor petrolífero circulam, reagem e são armazenados via processos de reação e de transformação, em fl uxo contínuo ou bateladas, com intervenção de cada parte no processo de transformação. Sendo assim, para segurança e funcionamento sustentável da planta, o sistema deve estar íntegro, até porque a infl amabilidade dos fl uidos é um complicador, que exige atenção permanente em relação a ocorrências relacionadas a vazamento de fl uidos, contaminações, incêndios, explosões, etc.
 
Valores imensuráveis

Vida humana, patrimônio e meio ambiente são valores cada vez mais presentes no alicerce da atividade dessas empresas, elevando o rigor a níveis sempre crescentes para a prevenção de riscos e de acidentes.

“A integridade e a segurança de um determinado equipamento ou sistema, nasce no momento em que este equipamento é projetado, de forma que o perfeito funcionamento de um equipamento ou sistema considere bom projeto, boa fabricação, bom comissionamento no início de suas atividades, inspeções, operação adequada e manutenção executada com base nos mecanismos de danos aos quais são submetidos esses sistemas”, resume Lescovar.

Essa abrangente transdisciplinaridade exige do gestor de uma planta petroquímica a construção de uma memória de cada equipamento para execução de metodologia baseada em quatro passos, olhando cronologicamente para o assunto integridade de ativos: identifi cação dos ativos, classifi cação dos mesmos, priorização baseada em risco e execução (ação) de atividades de inspeção, manutenção, alteração, reparo ou troca.

Cuidados e prioridades: atenção às variáveis

No processo de construção dessas boas práticas, duas preocupações devem ser levadas em conta para se implementar um processo de integridade de ativos, na visão do diretor técnico da SGS do Brasil: o uso da tecnologia disponível que estiver ao alcance para aquisição de dados, e o conhecimento humano referente a interpretação desses dados, e geração de ações de curto e longo prazos.

A chegada da indústria 4.0 favoreceu a disponibilização de dados que, agora, passam a ser tratados de forma muito mais integrada, e disponibilizados para programas e aplicativos que favorecem a tomada de decisão com menor interveniência do ser humano. Lescovar enfatiza, também, a ação preventiva nos mais diversos sistemas, para a inspeção baseada em risco e dados reais, manutenção e lucratividade, tais como medições de espessuras remanescentes, condições operacionais de vazão, pressão e temperatura, além do uso de bases de dados consolidadas ao longo das últimas décadas, situando entre as áreas prioritárias “aquelas associadas a equipamentos críticos estáticos e rotativos, sistemas de caldeiras, válvulas de segurança (PSVs) e estruturas de suporte essenciais para o funcionamento da planta”.

Nesse campo, para o diretor técnico da SGS do Brasil, há diversos players que já disponibilizam no Brasil “inúmeros sensores em suas plantas e sistemas integrados que trazem ao dashboard todos os indicadores e informações relevantes para que se faça a gestão da integridade, assim como possuem equipes bem formadas e estruturadas”.

Somam-se a essas decisões de curto prazo, várias análises estratégicas de informações e dados, tais como de disponibilidade de planta, de vida remanescente, de estratégias de manutenção e de otimização de itens em estoque. “O desafi o é grande, mas, para avançar, temos condições humanas e tecnológicas que caminham lado a lado com a comunidade mundial no que diz respeito a conhecimento e inovações”, garante Lescovar.
 
 
Mas, também existem percalços a serem vencidos, que são sinalizados pelo consultor, a exemplo de “distanciamento signifi cativo entre o que existe de tecnologia disponível, e o que foi possível se implementar em algumas plantas brasileiras, que já possuem desgastes que remontam de diversos anos passados”. Tal realidade exige do Brasil tarefa abrangente de atualização e agrupamento de informações técnicas, assim como priorização dos passos a serem executados, para elevação da integridade dos ativos e, como consequência, ganhos em disponibilidade de planta e retorno fi nanceiro.

A teoria na prática

Empresas globais possuem programas mundiais com características regionais, desenvolvidos internamente, atendendo a requisitos corporativos, e também a aspectos legais do Brasil. O acompanhamento dos resultados e a revisão periódica das políticas são práticas comuns. As implementações datam da década de 1980.
 
No caso da Solvay, que, no Brasil, também atua com a marca Rhodia, a política foi estruturada sob a coordenação da Direção Industrial do Grupo Solvay, e é marcada pela realização de estudos de segurança de processos para todas as instalações e operações, revisados a cada cinco anos. Há, também, “forte prática de MOC (Management of Change), em que toda e qualquer modifi cação no processo produtivo, seja ele em equipamentos, parâmetros de operação ou componentes, é analisada por uma equipe multidisciplinar sob a ótica da segurança”, resume Guilherme Faria Silva, diretor da Plataforma Industrial da Solvay em Paulínia (SP).
 
Na Bayer, por sua vez, de acordo com Marcia Peron – gerente Corporativa de Saúde, Segurança e Meio Ambiente – “os programas abrangem todo o ciclo de vida das instalações e equipamentos, partindo de avaliações criteriosas de Segurança de Processo em todas as etapas de projeto de novas instalações, gestão de manutenção/inspeção e gestão do processo operacional por meio de procedimentos formalizados. São aplicados conceitos de prevenção como design intrinsicamente seguro, uso de equipes multifuncionais de forma a promover a participação efetiva de todas as áreas envolvidas no tema e sistemática de monitoramento através de indicadores de performance”.
 
Automação: parceria inestimável

Ao adicionar sensores para medir as condições dos processos operacionais e dos ativos, e softwares e sistemas para monitorar e controlar a integridade dos ativos, e garantir operações seguras, efi cazes e produtivas que atendam ao potencial de projeto da fábrica, os fabricantes químicos e petroquímicos podem melhorar muito a integridade dos equipamentos, e mitigar riscos. E, com a facilidade de implementação dos transmissores wireless, os sensores podem medir quase tudo, desde a integridade dos ativos rotativos, até os ativos fi - xos, como tubulações, vasos e trocadores de calor. Essa afi rmação de Marcelo Carugo, diretor Sênior Global de Indústrias de Refi no e Química da Emerson Automation Solutions, resume os ganhos proporcionados pelos sistemas de automação, quando o assunto é integridade das instalações e gestão dos riscos inerentes à operação de plantas industriais da área química e petroquímica.

Os novos sensores e as tecnologias wireless favoreceram a capacidade de expandir o monitoramento para ativos essenciais, muitos em áreas remotas, onde a energia e a fiação não estão disponíveis. Os softwares preditivos de análise, por sua vez, transformam grandes dados em informações acionáveis, mitigando o risco de produção reduzida, e paradas não planejadas.

Nesse contexto, segundo Carugo, a próxima etapa compreende tecnologias digitais como Digital Twin, simulação de planta e realidade aumentada, que podem ajudar a treinar o pessoal a utilizar efetivamente essas novas informações, bem como testar cenários de otimização e conformidade antes mesmo de implementá-las.

“Com base em nossa experiência com a implementação dessas tecnologias globalmente, identifi camos potenciais economias na faixa de 7% a 15% do EBITDA”, prevê o diretor da Emerson, lembrando que a empresa possui uma biblioteca com mais de 80 práticas comprovadas de melhoria de valor para impulsionar a excelência operacional em programas de disponibilidade, produção, segurança e redução de energia, além de um longo histórico de fornecimento de excelência na implementação de projetos de capital em fábricas em todo o mundo.
Ao simular todas as operações e equipamentos da unidade, o operador desenvolve um “modelo mental” mais completo e preciso da planta, entendendo a causa e o efeito de suas ações e as interações complexas da plataforma de automação com o processo.
 
Benefício das normas
As normas facilitam a vida cotidiana, aumentando a segurança e racionalizando as operações, pois, a padronização garante que os produtos, serviços e os métodos sejam corretamente adequados ao uso pretendido, assim como que os equipamentos, processos e produtos sejam seguros, compatíveis e interoperáveis. Esse resumo de João Bassa – consultor na Maham e diretor de Normas na ISA Brasil – sinaliza o papel das normas e dos padrões no desenvolvimento de projetos e operações de forma estruturada e com diminuta “personalização”, reduzindo os custos de instalação, construção, partida e operação. Também promovem a padronização de partes e componentes, reduzindo o volume de sobressalentes em estoque. Finalmente, permitem aumentar a segurança das instalações, o que, em suma, se traduz em menores custos operacionais e maior produtividade.

Destacando o papel colaborativo de desenvolvimento de normas, Bassa ressalta, entre os benefícios a maior comunicabilidade entre os envolvidos, a redução de interpretações errôneas, a aplicação prática do acumulado conhecimento especializado, evitando o início de cada aplicação ou projeto a partir do zero ou baseados no incerto conhecimento individual do executante. Em resumo: “A adoção das normas incrementa a segurança e a excelência operacional, melhorando o desempenho, reduzindo os custos e os tempos de inatividade”, garante.

Hoje, no Brasil, há poucas normas ABNT no setor, porém, está sendo organizado um trabalho que englobará a tradução e adequação da ISA/IEC 61511, que é tida como o carro-chefe, quando o assunto é segurança em processos, sendo adotada mundialmente como padrão.

 

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