Revista Petro & Química
Edição 360 • 2015

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A (necessária) expansão do parque refinador
 
 
País precisará ampliar produção de derivados –
mas faltam interessados em construir novas refinarias
| Flávio Bosco

A Refinaria Abreu e Lima começa a aliviar um dos desafios da Petrobras – e do país: o abastecimento do mercado interno. Só alivia. Para suprir as necessidades, ainda será necessário importar combustíveis. Apenas para atender a demanda por diesel, hoje próxima de 1 milhão de barris diários, a Petrobras precisa trazer de fora 180 mil barris por dia. A Rnest, operando a plena carga, tem capacidade para produzir 160 mil barris de diesel por dia. A lacuna fica ainda maior quando são projetadas a demanda e a oferta até 2023 – ano em que, segundo as previsões da Empresa de Pesquisas Energéticas - EPE, o consumo de diesel deve saltar para 1,3 milhão de barris por dia, mas só haverá mais uma refinaria, o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, que adiciona 70 mil barris de diesel à oferta.

Quando são somados todos os derivados que precisarão ser importados, o déficit passará de 700 mil barris dia. Hoje o país importa em média 540 mil barris de derivados – principalmente diesel, nafta, GLP e gasolina – e exporta 240 mil barris – óleo combustível e combustíveis e lubrificantes para aeronaves e navios representam mais de 80% desse volume. Para manter a dependência externa próxima de zero, o país necessitará de pelo menos mais duas refinarias, com capacidade de 200 mil barris/dia cada – além de equacionar um segundo trem para o Comperj, que teria capacidade de 300 mil barris/dia.  


Tudo contra

O parque nacional de refino é formado atualmente por treze refinarias da Petrobras e quatro refinarias privadas, com capacidade de processamento da ordem de 2,3 milhões de barris por dia. Em qualquer mercado aberto, não faltariam interessados em construir novas refinarias –nenhum deles, no entanto, se anima a disputar espaço com um concorrente que detém 99% do mercado e seus preços de realização não acompanham os custos do petróleo. Para complicar, o prejuízo causado pela venda de combustíveis precificados abaixo dos custos de importação tirou da Petrobras o fôlego para erguer as duas refinarias que resolveriam esse déficit e ainda transformariam o país em exportador de derivados. Segundo cálculos do Grupo de Economia e Energia da UFRJ, entre 2011 e 2014 a Petrobras acumulou perdas de R$ 98 bilhões com a disparidade de preços. “Esse modelo, em que apenas uma empresa tem oportunidade de negócios no segmento de refino, não é bom para o país. Os projetos das refinarias Premium estão sendo abandonados, não existe a perspectiva de que outras empresas se interessem por eles, e a Petrobras não consegue recuperar o dinheiro que já gastou. Em um mercado aberto, a Petrobras não faria o write off, mas buscaria sócios ou venderia esses projetos para outras empresas”, destaca o professor Edmar de Almeida, do Instituto de Economia da UFRJ.

As duas refinarias Premium – que seriam erguidas no Maranhão e no Ceará – começaram a ser planejadas em 2008, sob a justificativa de agregar valor ao excedente de petróleo extraído do pré-sal – ao invés de exportar petróleo cru, a Petrobras venderia derivados de maior valor no mercado internacional. A Premium I, no Maranhão, teria capacidade para processar 600 mil barris por dia, e a Premium II, no Ceará, 300 mil barris. Com a disparada na demanda por combustíveis, as duas passaram a ser consideradas para abastecimento do mercado interno. A primeira entraria em operação no final de 2018 e a segunda um ano depois. Agora a Petrobras decidiu abandonar os dois projetos, depois de gastar R$ 2,7 bilhões.

A notícia decepcionou a cadeia fornecedora de equipamentos e serviços. “No ano passado fechamos aproximadamente R$ 8 bilhões em vendas para o setor de petróleo e gás, a maior parte para os projetos de refino. Esse cancelamento chega para nós como uma péssima notícia. Ficamos sem perspectivas de novas encomendas no curto e no médio prazo”, reclama o presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos, José Velloso Dias Cardoso.

E caso decidisse levar adiante as refinarias Premium, a Petrobras precisaria resolver outro impasse: as EPCistas nacionais que vêm tocando as obras em andamento – e que, portanto, teriam expertise para executar os novos projetos – estão proibidas pela própria companhia de participar de novas licitações, por terem sido citadas nas investigações da Operação Lava Jato. Abrir a licitação a empresas internacionais – opção já adotada pela Petrobras para a construção dos módulos dos FPSOs replicantes que estavam sendo fabricados pela Iesa –importará novos parâmetros de produtividade e fomentará a ascensão de novas EPCistas e a associação de grandes engenharias internacionais com empresas nacionais. Há, no entanto, o risco de redução dos índices de conteúdo local nos empreendimentos.

Cancelar os dois projetos pode ter sido a decisão mais acertada. Mesmo depois de revisadas, as duas refinarias não conseguiam demonstrar economicidade nem atrair interessados em entrar como sócios no negócio. “Para o custo que elas estavam atingindo – inexplicável pelo lado da engenharia – com uma capacidade que não era ótima e uma localização muito menos ótima para atender ao sistema de abastecimento nos próximos anos, a interrupção dos projetos das refinarias Premium foi uma decisão acertada. Equivocada é a não expansão do parque refinador brasileiro”, explica o professor Alexandre Salem Szklo, do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ.

Pelos seus cálculos, até 2035 o país precisará adicionar 800 mil barris à capacidade instalada – nesse número estão somados o segundo trem da Rnest, com 115 mil barris, um segundo trem para o Comperj, de 300 mil barris, e mais duas novas refinarias, na região Nordeste e na região Sudeste, com capacidade para processar 200 mil barris por dia cada. Nas primeiras entrevistas concedidas após assumir o comando da Petrobras, Aldemir Bendine confirmou que o plano de investimentos sofrerá cortes, para se adequar à cotação do petróleo e a dificuldade de captar recursos. A prioridade será dada aos projetos mais rentáveis – o que coloca o refino em desvantagem perante a exploração e produção de petróleo. Resta saber em qual ritmo serão tocados o segundo trem da Rnest e o Comperj.
 
 
 


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