Edição 328 • 2010

Um olho no pré e outro no pós
Embora o Brasil – e o mundo – tenha voltado os olhos para o pré-sal, o petróleo ali guardado só jorrará, para valer, na segunda metade da década. Até lá, o aumento na produção de petróleo e gás natural será sustentado, basicamente, pela instalação de novas plataformas em áreas fora do cluster

Flávio Bosco

No mês passado, a UFRJ assinou um termo de concessão de um terreno de 20 mil m² para a construção do Centro de Tecnologia da FMC no Parque Tecnológico do Rio. É o terceiro centro de pesquisas confi rmado pelas empresas estrangeiras – Baker Hughes, Schlumberger e outras empresas nacionais dedicadas ao desenvolvimento de tecnologias para extração de petróleo e gás do pré-sal que já começam a dar à área de 350 mil m² localizada na Ilha do Fundão o apelido de "Vale do Silício do pré-sal". Cada centro desses deve abrir as portas para aproximadamente 300 engenheiros – ali, e também em outras universidades, essa é a forma mais visível de como o petróleo, mesmo ainda aprisionado abaixo da extensa camada de sal na costa brasileira, já começou a transformar o desenvolvimento científico no país. Há muito mais por vir. "O Brasil é, sem dúvida, a principal fronteira petrolífera fora da Opep, com um papel estratégico muito importante para as empresas internacionais e para os países importadores: é onde elas ainda podem investir e onde a produção contribui para aumentar a confiabilidade da oferta", explica o professor Edmar de Almeida, do Instituto de Economia da UFRJ. No curto prazo, a história é diferente: tudo o que gravita em torno do petróleo no Brasil continuará se movendo graças aos reservatórios localizados acima da camada de sal.

Eles ainda representam um filão muito maior para as petroleiras e para a cadeia de fornecedores. Do início de 2009 até hoje, a Agência Nacional do Petróleo recebeu 125 notificações de indícios de hidrocarbonetos em bacias terrestres e 106 em mar sendo que apenas nove dessas estão localizadas no cluster do pré-sal. No mesmo período, foram 38 declarações de comercialidade em terra e apenas três em mar - nenhuma delas no pré-sal. Para que o petróleo do pré-sal comece a jorrar para valer, ainda serão necessários alguns anos. Neste momento, a Petrobras e seus fornecedores trabalham simultaneamente na construção de nove grandes plataformas, que absorverão mais investimentos do que a exploração de novas áreas e os projetos do pré-sal: dos US$ 108,2 bilhões previstos no Plano de Negócios da companhia, US$ 75,2 bilhões estão reservados para os projetos do pós-sal – mais do que o dobro do orçamento destinado aos reservatórios do pré-sal nos próximos cinco anos. Esses projetos serão responsáveis pelo salto de 41,9% na produção nacional até 2014 – a Petrobras prevê que a produção de petróleo e gás no Brasil salte dos atuais 2.335 mil barris para 3.603 mil barris de óleo equivalente por dia em 2014.

Pouco disso virá dos poços do pré-sal – exatamente 241 mil barris por dia. Para 2020, a Petrobras tem como meta uma produção de 5.059 mil barris de óleo equivalente por dia, sendo 1.183 mil barris extraídos das reservas do pré-sal que já estão em carteira sem considerar o potencial dos prospectos que serão utilizados na cessão onerosa ou de outros projetos em que, pelo novo marco regulatório, a companhia teria assegurados 30% de participação. Mas, então por que o pré-sal causa tanto frenesi? A diferença é que esse petróleo posicionará o Brasil em um lugar de destaque no cenário internacional.

O petróleo continuará sendo a principal fonte de energia no planeta ao longo das próximas duas décadas e seu consumo deve aumentar 40% segundo a Agência Internacional de Energia – IEA. Para atender à essa demanda, a produção mundial deverá passar de 85 milhões de barris para 120 milhões de barris diários. "Mesmo com baixo crescimento de demanda, com a substituição tecnológica possível e a alternativa de novos provedores de energia, em 2020 teremos uma demanda entre 43 milhões e 48 milhões de barris por dia superior à produção atual", projetou o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, ao apresentar o plano de investimentos da companhia. Já em 2011 a demanda mundial por petróleo irá crescer para 87,8 milhões de barris ao dia – uma alta de 1,6% sobre o consumo atual, puxada sobretudo pela industrialização nos países que não fazem parte da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico – OCDE.

Segundo a Agência Internacional de Energia – IEA, a demanda nos países fora da OCDE irá subir 4,5% em 2010 e de 3,7% em 2011, e entre os países da OCDE irá crescer 0,2% este ano, mas cair 0,4% em 2011. Do lado da oferta, os países não-OCDE adiciona- rão 465 mil barris em 2011 – o Brasil deverá dar a maior contribuição individual, com 300 mil barris. A IEA também calcula que a oferta nos países que não fazem parte da Opep deverá crescer 400 mil barris por dia, para 52,8 milhões de barris por dia. Em 2010, a produção média diária de petróleo e gás registrada no primeiro semestre no Brasil já alcançou 2.485 mil barris – um ligeiro aumento de 5,7% em relação aos seis primeiros meses de 2009.

O que importa é que bilhões de barris de petróleo e gás ainda estão guardados nas entranhas da terra, esperando para ser extraídos e, Deus queira, gerar riqueza. A Agenda de Competitividade da Cadeia Produtiva de Óleo e Gás Offshore no Brasil, um estudo enco- mendado pela Organização Nacional da Indústria do Petróleo à consultoria Booz & Company, identifi cou entraves e propôs dez itens – que vão da disseminação da inovação tecnológica ao longo da cadeia ao acesso a matérias-primas e infraestrutura em condições com- petitivas – para evitar que gargalos comprometam a participação dos fornecedores brasileiros em um vo- lume de investimentos calculado em US$ 400 bilhões até 2020. Hoje, a cadeia de petróleo e gás offshore emprega cerca de 420 mil pessoas no país, mas esse número deverá multiplicar rapidamente. Com a aplicação das políticas de competitividade, a Onip aposta na gera- ção de 2,1 milhões de empregos até em 2020 – se as propostas forem ignoradas, no entanto, a geração de novos postos nos próximos dez anos ficará limitada a 400 mil vagas, sem que todas as oportunidades tenham sido aproveitadas.

 




O berço do campo digital
Longas distâncias da costa incentivam
operação remota de plataformas
Ninguém mais duvida que a extração de petróleo e gás da camada pré-sal trará novos paradigmas para a indústria. Um dos mais revolucionários será o Gerenciamento Integrado de Operações – foi com esse nome que os engenheiros da companhia batizaram o campo digital. Trata-se de uma iniciativa que unifica, em um centro localizado em terra, o ambiente de decisão hoje alocado dentro das plataformas. Os motivos são muitos. Um deles reside nas difi culdades logísticas relativas a plataformas localizadas a 300 km da costa – para se ter idéia, são poucos os helicópteros que têm autonomia 600 km para levar e trazer petroleiros até o continente. Engenheiros de poço, de processamento, ou os especialistas que trabalhavam embarcados passarão a trabalhar em grupos, acompanhando remotamente a operação de várias plataformas – dessa forma, as decisões operacionais podem ser tomadas com maior embasamento e rapidez.

O impacto na operação está diretamente relacionado a manutenção baseada na condição – que exige um monitoramento dos equipamentos críticos, como geradores, bombas e sistemas de compressão. A Petrobras embarcou nessa onda de gerenciamento digital em 2005 – numa fase de avaliação, o programa de Gerenciamento Digital Integrado de Campos de Petróleo - Gedig estudou a metodologia de campo digital em seis projetos pilotos. De posse do know how, agora a companhia ampliará a filosofi a para o cluster do pré-sal da Bacia de Santos, começando já pelo FPSO que fará o projeto piloto na área de Tupi – a companhia, inclusive, já abriu licitação para adquirir um sistema que irá gerenciar todos esses dados que chegarem das plataformas. No Mar do Norte e no Golfo do México, Statoil, Shell, NorskeHydro, BP e suas prestadoras de serviço já lidam com o assunto – cada uma de forma diferente e com diferentes objetivos. "Há uma lista de vantagens: reduzindo a quantidade de pessoas na plataforma, há uma redução no custo da logística e no risco.

A empresa também pode reduzir as dimensões dos aposentos nas plataformas, reduzindo peso ou abrindo espaço para outras unidades de processo", conta o líder de vendas da Chemtech, Rafael Teixeira. A Chemtech participa atualmente dos trabalhos que a americana Indx desenvolve para a Exxon monitorar em tempo real seus campos. Entre os trabalhos já consolidados, está a integração das refi narias da Exxon, feito em parceria com a Siemens – no mapeamento de processos e definição de indicadores com o software XHQ. Tecnologias para acionar os equipamentos de forma re- mota e softwares supervisórios para monitorar o processo já estão disponíveis, municiando o operador com informações suficientes sobre a operação. Mas o conceito de digital oilfield ainda não está formado. "O que se tem de base é mapear os processos e ter um nível de instrumentação que permita acompanhar dados de cabeça de poço, árvores de natal, manifold, risers e até o topside da plataforma, de forma integrada. Hoje existe tecnologia, mas ninguém parou para escrever uma norma para reger um digital field".

O executivo destaca o projeto da Saudi Aramco – que envolve desde a cabeça do poço até a saída dos derivados da refi naria. O projeto envolveu desde o mapeamento dos processos, a implementação de uma base de instrumentação com um software Scada como supervisório dos processos e uma ferramenta XHQ como camada de visualização com indicadores de performance. "Eles têm até KPIs relacionados a meteorologia, centralizados em uma única sala de operação".
 
Novos FPSOs para a Bacia de Santos
Ainda este ano o cluster do pré-sal da Bacia de Santos irá receber o FPSO Cidade de Angra dos Reis – uma plataforma com capacidade de produção de 100 mil barris por dia, que será utilizada no projeto piloto na área de Tupi – e o FPSO Dynamic Producer, que fará o teste de longa duração no prospecto de Guará. Em Tupi, no BM- S-11, atualmente está instalado o FPSO Cidade de São Vicente, realizando um teste de longa duração. O FPSO Cidade de Angra dos Reis dei- xou o estaleiro Cosco, na China, e deve chegar ao Brasil em setembro. Na locação de Tupi, será interligado a oito poços que irão aprofundar o comportamento sobre os reservatórios carbonáticos localizados abaixo da extensa camada de sal.

Com o consórcio Schahin/Modec, a Petrobras assinou contrato para a conversão de um VLCC no FPSO Cidade de São Paulo, que será alocado no projeto piloto na área de Guará, no BM-S-9. O FPSO terá capacidade para produzir 120 mil barris de óleo e 5 milhões de m3 de gás por dia, e deve entrar em operação em 2013. Para o prospecto de Tupi Nordeste, a Petrobras está planejando a instalação de um FPSO com capacidade de 120 mil barris diários, a partir de 2014 – a companhia já assinou acordo com a SBM e a Queiroz Galvão para a construção da plataforma – enquanto estuda se irá utilizar o FPSO Cidade de São Vicente ou outra plataforma no teste de longa duração programado para a área. No total, até 2014 o cluster do pré-sal receberá onze testes de longa duração. O Programa Exploratório Obrigatório das áreas cedidos no processo de capitalização da Petrobras começará pelo campo de Franco e terminará no campo de Iara. A fase exploratóri a das sete áreas cedidas pela União terá qua- tro anos e prevê a aquisição sísmica 3D e a perfuração de oito poços. A expectativa da companhia é de realizar quatro testes de longa duração - o primeiro deles na área com um FPSO com capacidade para 150 mil barris/dia.
 

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