Edição 322 • 2010

Pelo ar em alto mar
Plataformas de petróleo começam a adotar novas
tecnologias para transmissão de dados sem fio

Flávio Bosco

Mesmo que de forma tímida, as soluções wireless começam a desembarcar nas plataformas de petróleo. Em
águas nacionais, dados de automação saem dos CLPs e chegam ao sistema supervisório sem atravessar fio os em
pelo menos cinco plataformas da Petrobras. Na P-53, pela primeira vez uma arquitetura foi baseada no padrão
IEEE 802.11g – Wi-Fi. Foi uma sugestão da Siemens, fabricante dos controladores programáveis - CLP instalados na plataforma.

Também é só – pelo menos por enquanto. Diante de outros desafio os– principalmente da extração do petróleo
da camada pré-sal – a utilização de instrumentos wireless ainda não foi definida como prioridade pelos engenheiros da companhia. Antes de ser adotada nos novos projetos ou nas modernizações das plataformas existentes, a Petrobras precisa estar certa da eficácia da tecnologia. E olha que, quando o assunto é tecnologia, a companhia
só admite uma posição bastante conservadora. “Uma plataforma de petróleo não é um laboratório, para
ficar experimentando e arriscando tecnologias que ainda não estão disseminadas”, ressalta o engenheiro de
equipamentos da Petrobras, Nilson Caetano da Silva Jr.

A comunicação sem fio já não é exatamente uma novidade – em todos esses navios-plataformas do tipo Floating Production Unit - FPU que utilizam os sistemas turret para ancoragem e conexão das linhas com o fundo do mar, a troca de dados pode ser feita através de radiolink.
Na P-53 a estratégia de aplicação de rede sem fio foi desenhada ainda na fase de detalhamento da plataforma –
embora desenhar um projeto para uma unidade já em operação não seja uma limitação, uma vez que qualquer plataforma já traz alguma forma para captura e envio de dados. Por dia, a unidade instalada no campo de Marlim Leste, na Bacia de Campos, produz 180 mil barris diários, comprime 6 milhões de m³ de gás e gera 92 megawatts de
energia elétrica. Seu turret, considerado o maior do mundo, tem capacidade para 75 risers – que interligam poços a 1080 metros de lâmina d’água.

Passados pouco mais de um ano do início da operação, o sistema “funciona a contento”, explica o engenheiro,
lembrando que itens como reclamações e demanda de manutenção – que não ocorreram desde a entrada em operação – são parâmetros utilizados para medir a performance da solução, já que, em cada plataforma, há uma composição diferente para esse tipo de sistema.

Em suma, dois enlaces de rádio realizam a comunicação entre os CLPs redundantes do turret com os CLPs
redundantes do navio. Os outros dois enlaces realizam a conexão dos CLPs do turret com os servidores de dados
do sistema de operação e supervisão da unidade de produção. As informações de controle e intertravamento
que são trocadas entre os sistemas de automação do navio e do turret com o sistema supervisório poderiam trafegar por um sistema de rádio-enlace baseado no padrão wi-fi em faixa de 2,4 GHz. Encontrar CLPs com essa tecnologia não era problema – já que a fornecedora
tinha disponível esse tipo de equipamento.

Diante de duas opções – o padrão IEEE 802.11a e o padrão IEEE 802.11g – a escolhida foi a que apresentava
um leque maior de equipamentos. Encontrar equipamentos
com a tecnologia wi-fi era mais fácil e, por isso, mais barato. Outra característica sedutora do padrão wi-fi é a
manutenção do enlace, mesmo que condições adversas provoquem a redução da taxa de transferência de dados.
O engenheiro destaca a atenção dada ao critério de locação das antenas – com uma analise criteriosa das estruturas e equipamentos que podem interferir na transmissão dos dados. Aplicar uma rede sem fio em
uma plataforma, embora possível, demanda um levantamento de campo bastante cuidadoso – principalmente com relação aos níveis adequados das
taxas de transmissão.

“Na montagem da solução apresentada, tínhamos a preocupação com as interferências e atenuações sobre os pontos localizados na torre de telecomunicações da plataforma, que fica na popa do navio, e no turret, localizado na proa. Acabamos optando por instalar as
antenas de transmissão e recepção próximas”.
Com pouquíssimas variações, a comunicação sem fio pode ser uma alternativa em qualquer área da plataforma
que utilize fibra óptica ou rede ethernet. As restrições se referem, claro, aos equipamentos submersos ou que ficam enclausurados – e que, de alguma forma, necessitam
de solução para propagar seus sinais.

A questão da cybersegurança nem ocupa o topo da lista de dúvidas – até porque, num ambiente em que o acesso de pessoas pode ser controlado, e qualquer outra embarcação não consegue se aproximar de uma plataforma sem que seja notada, as soluções de firewalls, criptografia e autenticação já são suficientes para evitar qualquer acesso indevido. As maiores preocupações ainda estão relacionadas a capacidade de tolerância a falhas e auto-recuperação de links. “Uma tecnologia sem fio, atendendo a algumas dessas exigências e alguns dispositivos que podem reforçar o gerenciamento e a segurança, merece ser avaliada”, finaliza Nilson.




Específico para área industrial, wirelessHart previne falhas comuns à transmissão sem fio


Domingo, 6:45. Queda na conexão entre o transmissor
de temperatura e o gateway. O sistema nem nota – em
três segundos, aquele transmissor encontra um outro transmissor mais próximo, e estabelece uma rota alternativa para transmitir as informações. Conexão restabelecida. Bem vindo a era do wirelessHart. O padrão que une a rede Hart com a tecnologia de transmissão de dados sem fio foi desenvolvido em formato mesh – na prática, cada instrumento de medição também tem a função de retransmitir o sinal. Pensado para ser aplicado em pontos de difícil acesso – onde a ronda dos operadoresé sinônimo de risco de acidentes – ou que tornam inviável ou dispendiosa a instalação de cabos – como fornos rotativos e aquecedores indutivos – a tecnologia começa a ganhar espaço da estrutura de cabeamento tradicional, para monitoramento de pressão
e temperatura.

“Além de ser definido em conjunto com a Hart Foundation, o wirelessHart está em fase final de aprovação pelo International Electrotechnical Commission - IEC”, destaca o diretor de sistemas da Emerson Process,
Claudio Fayad, um dos maiores entusiastas da tecnologia no Brasil. Algumas aplicações já sentem segurança em adotar essa instrumentação sem fio até mesmo para controle – como em um projeto desenvolvido nos laboratórios da Universidade do Texas, com uma coluna de destilação, em que o algoritmo PID foi alterado para acelerar o tempo de envio das informações. “Em alguns casos, adotamos a instrumentação wireless para controle de temperatura e pH, onde o tempo de resposta pode ser menor do que 4 segundos”, conta diretor da Emerson Process.

A vantagem óbvia do sistemaé a eliminação da fiação, que pode ser um fator complicador quando existe pouco espaço físico para a disposição de eletrodutos, quando as distâncias envolvidas são muito grandes e que podem encarecer o projeto – ou ainda nos casos em que os equipamentos se movimentam, inviabilizando a utilização
de cabos. “Atualmente qualquer modificação numa plataforma existente é muito mais facil de viabilizar com wireless que com convencional”, ressalta o diretor de Vendas da Honeywell do Brasil, James Aliperti.

Na análise do executivo, a tecnologia wireless é mais utilizada em plataformas de petróleo do que se acredita
– o que ainda não está difundido é o uso de transmissores sem fio, por conta de um conservadorismo natural de
um setor que tem considerações particulares de suporte e manutenção. Depois de uma bem sucedida aplicação
para monitorar a pressão anular no wellhead e pressões no trocador de calor na plataforma de Grane, no mar da Noruega, a StatoilHydro já têm o wirelessHart como padrão para interligação dos sensores de monitoração
sem fio.
A BP instalou 40 transmissores de pressão sem fio no campo onshore de Wytch Farm, no Reino Unido. A leitura
manual de medidas de pressão na plataforma foi identifi- cada como uma área que poderia ser melhorada, mas transmissores conectados por fios eram simplesmente muito caros devido à infraestrutura de instalação elétrica. Dois transmissores foram montados em cada poço, e um único gateway sem fio foi instalado fora da área de processo, conectando os transmissores ao sistema de controle.
Na refinaria da Chevron em Richmond / EUA, 16 access points da Cisco e 12 gateways da Emerson Process cobrem uma área superior a 80% dos sensores – trata-se da maior rede wireless já instalada em uma refinaria.
No Brasil, a mais recente instalação Emerson Process monitora a pressão, temperatura e vibração de dois dos quatro compressores na Unidade de Compressão de São Mateus – são 56 transmissores coletando dados e enviando a um gateway interligado ao sistema de manutenção preditiva.

Nesse caso, instalar um sistema de monitoramento signifi- caria eliminar as rondas dos operadores que coletavam
os dados manualmente – e a opção pelo sistema adotado significou uma economia de US$ 200 mil em relação a uma instalação convencional com cabos e eletrodutos.
Um estudo realizado por dois consultores da Emerson Process em uma planta de aromáticos com hidrotratamento, calcula em até 36% a economia gerada com instrumentação wireless, em relação a instalação de
rede 4-20 mA com cabeamento tradicional e placas de I/O. Os resultados mostram também que 44% dos sinais
podem ser implantados com instrumentação wireless.

“Este estudo efetivamente comprova que a tecnologia
wireless não precisa ser restrita ao número limitado de cenários onde o custo é proibitivo ou seja impossível
implantar cabos”, afirma Dan Daugherty, um dos autores do estudo. A própria Petrobras tem um estudo referente a instrumentação de uma unidade de hidrotratamento, que
aponta economias mesmo no caso de uma planta nova. “Embora estudos deste tipo sejam interessantes, não focalizam o cerne da questão, que não é o custo de uma alternativa contra a outra, mas a resistência natural ao uso de uma tecnologia nova, e até certo ponto revolucionária, e as limitações reais que a instrumentação sem fio tem quanto aos tempos de atualização
ou consumo de bateria. A maioria das instalações atuais ainda está nos casos onde a solução sem fio resolve
um problema específico muito melhor que a alternativa convencional”, avalia James Aliperti.

Não há qualquer dúvida que a utilização da tecnologia sem fio traz ganhos econômicos – pelo menos para os novos projetos. Mas nos fóruns do setor, ainda é clara uma preocupação com o desenvolvimento de baterias com maior tempo de duração e que suportem condições de trabalho em ambientes hostis, com a aplicação da tecnologia wireless em áreas classificadas, com a segurança contra ataques de hackers e o padrão para transmissão de dados.

WirelessHart disputa com OneWireless o posto de wireless
“oficial” para aplicações industriais. A primeira conta com quase duas dezenas de fornecedores homologados. Já a segunda, criada nos laboratórios da Honeywell, tem o mérito de ser, certificado pelo Wireless Compliance Institute, conforme a ISA 100.11a – que ainda busca estabelecer um padrão global para comunicação sem fio na indústria. A função básica é a mesma – com uma pequena diferença na filosofia de trabalho: enquanto o wirelessHart permite que cada instrumento funcione também como um roteador de sinal, no OneWireless a
transmissão sempre é encaminhada para os dois dispositivos com o sinal mais forte.

Mais do que isso, a preocupação típica de quem vai instalar qualquer sistema wireless é a impossibilidade de garantia total da comunicação em 100% do tempo. “Uma preocupação entre alguns engenheiros é a possibilidade desses dispositivos wireless serem tão pouco confiáveis quanto os telefones celulares e o receio é de que quedas de ligação ou comunicações não recebidas possam causar problemas de segurança ou produtividade nas plataformas”, explica o professor Dennis Brandão, especialista em comunicação e informática industrial da Universidade de São Paulo.

Hoje os projetos desenvolvidos em arquitetura mesh estão em alta. Embora a chance de falhas possa ser reduzida com a adoção de distâncias máximas entre transmissores e receptores e a comunicação visual entre os dispositivos, a tolerância a falhas e a confiabilidade da transmissão leva a adoção da comunicação entrelaçada baseada na nuvem de irradiação. Esse tipo de desenho permite a continuidade da transmissão dos dados mesmo que um obstáculo interrompa o sinal direto. Isso porque, cada
instrumento também funciona como roteador – e o sinal emitido por um equipamento sai buscando rotas alternativas até encontrar o ponto de recepção final.

Nesse sentido, o índice de confiabilidade da rede cresce na proporção do número de instrumentos – quanto mais instrumentos, mais densa, e com mais caminhos alternativos, torna-se a rede. Aplicações mais avançadas
permitem até fazer um mapeamento com a localização de todos os instrumentos, e encontrar os chamados pinch
point – gargalos onde a informação só possui um caminho – para realocar os repetidores. Outra inovação é a chamada Frequency Hopping Spread Spectrum - FHSS: quando há interferência que impeça a comunicação na frequência programada, o instrumento busca outra banda para operar.

Fayad lembra que, como normalmente o tempo de atualização é maior do que quatro segundos, não haverá
nenhum impacto no monitoramento, mesmo que a retomada desse caminho leve um ou dois segundos. “Mesmo não apresentando componentes de redundância, é uma rede redundante por natureza, porque tem múltiplos
caminhos até o gateway”. O engenheiro William Kishi,
ligado à Coordenação Técnica da Yokogawa, ressalta que nenhum sistema é imune à perda de sinal – mesmo a instrumentação convencional.

A diferença é que o fio não pode alertar um operador sobre um problema, enquanto os links de comunicação
permitem saber que os dados não estão sendo transmitidos devido a uma perda de sinal entre um escravo
e o mestre. “Além disso, em caso de falha de comunicação, o escravo vai controlar suas saídas com base na condição default de segurança contra falhas”.



Controle avançado
Braskem amplia o uso de controle avançado para
elevar performance de plantas de polimerização

Fórmulas matemáticas sofisticadas, que prevêem como se comportam dezenas de variáveis ao mesmo tempo e simulam todas as restrições, com um objetivo bem defi- nido: conduzir a operação da planta para o ponto de melhor rentabilidade, na rota mais eficiente. Ficção científica? Não. Pergunte a qualquer especialista em automação como é possível mesclar as demandas técnicas da operação com as equações financeiras da corporação
e uma das respostas mais citadas será: controle avançado.

Trata-se de uma estratégia implementada um nível acima do sistema de controle do processo, que atua nos set-points das variáveis de operação para indicar o melhor arranjo. Quando o operador verifica qualquer alteração
na matéria-prima ou na temperatura dos reatores, sua decisão é muito semelhante a um motorista equipado com GPS: ele não precisa mais parar para perguntar o caminho.
Desde agosto do ano passado, quando os engenheiros concluíram a implantação do controle avançado em uma das plantas de polietileno da unidade PE4 da Braskem, localizada no pólo petroquímico de Triunfo / RS, os operadores contam com um apoio que vai além da simples padronização da operação.

“Já temos resultados promissores de redução de custos e de aumento de produtividade, significando benefícios fi- nanceiros tanto em épocas de baixa do mercado – quando
as reduções de custos são mais importantes – como em épocas de mercado aquecido – quando a taxas de produção estão no máximo, com operação nos limites dos equipamentos”, afirma o engenheiro de controle de processos da Braskem, Tiago da Silva Osório.

Essa planta utiliza, no processo de produção de polietileno com a tecnologia Spherilene, dois reatores de polimerização em fase gasosa em série – aqui a estratégia de controle avançado conta com três camadas de controle: um otimizador de produção, um controlador de composição da fase gasosa e um controlador de qualidade. O primeiro é responsável por otimizar a carga da unidade, atuando sobre a injeção de catalisador e de eteno nos reatores. Já o controlador de composição atua sobre as vazões de alimentação nos reatores – em suma, os dois respondem pelos benefícios financeiros. O controlador de qualidade controla a viscosidade e a densidade da resina, enviando setpoints para o controlador de composição, sendo responsável por manter o produto dentro das especificações.

Os benefícios dos projetos de controle avançado estão diretamente relacionados à redução da variabilidade: modelos que descrevem o comportamento estático e dinâmico do processo, os algoritmos de controle avançado conseguem prever o comportamento das variáveis e se antecipar às perturbações no processo. Com um melhor controle da variável, é possível mantê-la mais próxima
da sua restrição, sem ultrapassá-la. E quanto mais próxima essa variável estiver de seus limites operacionais,
maiores serão os resultados econômicos – as referências mundiais indicam ganhos de 3,5%. Há diferentes formas
de isto ocorrer: aumentar a carga média da unidade através do melhor controle e a sua aproximação dos limites; aproximar os produtos aos seus limites de
especificação, reduzindo as perdas e o reprocessamento de produtos fora de especificação; ou ainda reduzir o consumo de insumos.
Controle preditivo baseado em modelos
O controle avançado surgiu pela primeira vez dentro de uma refinaria, foi adotado com resultados expressivos
pelos crackers de nafta e, por conta da concorrência cada vez mais acirrada, ancorou com força total nas plantas
produtoras de resinas. O tema é uma das prioridades do Plano Diretor de Automação da Braskem – a empresa já tem sistemas desse instalados nas unidades de insumos básicos e plantas de polímeros em Camaçari/BA e Triunfo, e está implantando nas outras unidades de polietileno e polipropileno.

De cada dez das principais plantas petroquímicas do mundo, nove já adotaram alguma estratégia de controle
avançado – lógica fuzzy, controle adaptativo ou controle preditivo baseado em modelos – MPC, uma classe de algoritmos de controle que utilizam um modelo fenomenológico ou empírico do processo para predizer
as futuras respostas da planta. A maioria acabou optando por esse último por conta, principalmente, da sua capacidade de trabalhar com sistemas multivariáveis e com interação entre variáveis. Além disso, suas ações de
controle são calculadas levando em consideração as restrições nas variáveis manipuladas e controladas.

A diferença básica é que as plantas de craqueamento de nafta geralmente adotam controladores MPC lineares,
enquanto nas unidades de polimerização são utilizados controladores MPC não-lineares. De forma geral, as primeiras operam em uma única condição, dentro de especificações que não variam constantemente – os principais distúrbios estão relacionados a variações na matéria-prima utilizada.

Nas plantas de polímeros, a situação se inverte: a matéria-prima chega com qualidade relativamente estável, mas as condições de operação sofrem alterações com uma frequência elevada, para obtenção de produtos com especificações diferentes – uma planta de polipropileno, por exemplo, pode variar a concentração de hidrogênio no
reator em uma razão de dezenas de vezes em algumas horas.

Mesmo para plantas de polimerização, há diferenças em função da natureza do processo, da capacidade dos equipamentos e do mix de produção. “Os conceitos são os mesmos. A forma de se obter benefício econômico será semelhante. Porém cada processo tem suas peculiaridades e, desta forma, necessitam de soluções de controle que se adaptem a essas peculiaridades”, destaca Tiago Osório.
Implantar uma estratégia de controle avançado é um verdadeiro trabalho multidisciplinar.

É algo que vai além de malhas PID, malhas cascatas ou malhas antecipativas: são projetos caros, que não fazem parte dos sistemas de controle regulatório, e requerem
uma adaptação e customização para cada aplicação.
O passo a passo de um projeto desses começa pelo óbvio: definir, claramente, o seu objetivo. As características
próprias de cada unidade petroquímica fazem que com que fatores distintos limitem sua capacidade e sua controlabilidade. Junto a isso, um estudo de viabilidade para avaliação dos ganhos potenciais do projeto deve ser elaborado. Só a partir daí a equipe envolvida com o projeto passa a definir a melhor estratégia de controle – quais variáveis serão controladas, e quais serão manipuladas para efetuar o controle.

Nada garante que a implementação de um MPC será a estratégia recomendada em todos os casos – a aplicação a ser escolhida vai depender do nível de complexidade exigida para resolver o problema. “Em geral, o termo ‘controle avançado’ é utilizado em problemas de controle multivariável e preditivo, o que torna MPC e NMPC mais aplicável. Mas, entendemos que controle avançado seja qualquer tipo de controle em que se utilize conhecimento
do processo – em geral através de modelagem – para facilitar o cálculo das ações de controle.

Até mesmo o desenvolvimento de um PID com parâmetros variáveis em função das condições do processo já é um projeto de controle avançado”, ressalta o engenheiro de controle de processos Gustavo Alberto Neumann, que esteve à frente do projeto na Braskem. Na maioria das vezes, é necessário realizar uma adequação da infraestrutura de hardware de instrumentação, melhorias no controle regulatório e do sistema de informações de processo – as estratégias de controle avançado funcionam como uma camada de controle acima do regulatório, que necessariamente precisa estar operando satisfatoriamente.

Antes de implementar os controladores MPC propriamente ditos, há ainda a etapa de modelagem matemática – e, caso existam variáveis com tempo de amostragem superiores ao tempo de atuação do controlador, como
medições de laboratório, ainda haverá a necessidade de implantar analisadores virtuais. Engana-se, no entanto, quem acredita que uma planta já em operação dificulte o trabalho – na verdade uma planta em operação já tem dados históricos disponíveis para análise da operação da unidade e desenvolvimento dos modelos matemáticos utilizados no controlador.

O que acontece, em muitos casos, é que os técnicos estão acostumados a operar a planta sem controle avançado – daí, implementar uma estratégia de controle avançado significa quebrar paradigmas. Alguns sistemas de controle já trazem os controladores preditivos multivariáveis disponíveis como blocos – similares a PIDs – embora há quem considere que a solução mais eficiente
é ter o controlador fora do sistema de controle. Ter tudo residente no próprio SDCD parece ser uma opção bastante
interessante pois, além da facilidade de comunicação, reduziria o número de interfaces, tanto para as equipes
de operação e produção como para a automação.

De qualquer forma, é importante testar essas aplicações com controladores de grande porte, que tenham muitas variáveis, para ter certeza de que não há comprometimento na sua performance – na Braskem, os
sistemas implementados ainda são aqueles residentes em computador dedicado, onde os controladores se comunicam com o sistema de controle através do OPC DA.
A parte final da implementação é comum a qualquer projeto: treinamento, verificação da documentação e acompanhamento dos índices de desempenho e dos benefícios.

Gustavo Neumann explica que o retorno sobre o investimento se calcula comparando os cenários antes
e depois da implementação da nova estratégia de controle, computados os benefícios e considerados os custos de implementação – infraestrutura, configuração, modelagem, desenvolvimento dos controladores, licença
de softwares, serviços e horas de treinamento.

“Com os benefícios que o controle avançado traz para as plantas onde ele é instalado, a pergunta agora passa a ser: ‘porque não investir nessa tecnologia?’”. A justifi cativa mais óbvia para dar uma resposta negativa a essa questão seria o alto custo da implementação – que em uma planta produtora de resinas com capacidade de 300 mil toneladas pode chegar a R$ 1 milhão – e o tempo de implementação.

Para se ter uma idéia, do planejamento ao comissionamento – incluindo a configuração, modelagem
e desenvolvimento dos modelos, e treinamento e documentação – os engenheiros da Braskem levaram nove meses para implantar o projeto na planta Spherilene da unidade PE4 – mesmo com toda experiência adquirida
em outros projetos.
 
Nasce a superpetroquímica verde e amarela
Como foi a negociação que criou a oitava maior empresa petroquímica do mundo
Sexta-feira, 22 de janeiro. Este ano, os presidentes da Petrobras, da Braskem e do Conselho de Administração da Odebrecht não conseguiram enforcar nenhum dos dois feriados do epicentro econômico financeiro do país. Passaram parte da manhã e da tarde explicando – primeiro a investidores e analistas de mercado e logo em seguida a jornalistas – uma operação negociada nos últimos oito meses de exaustivas reuniões que invadiam madrugadas e
finais de semana.

A história dos precursores da petroquímica brasileira chegara ao fim, de forma quase melancólica. Os herdeiros
de Alberto Soares Sampaio tiveram que se curvar à implacável nova-organização-petroquímicamundial,
dominada agora pelos beneficiários dos altos preços do petróleo e pelos fundos de private equity – não fosse assim, corriam o risco de ver sucumbir o negócio criado em junho de 2008 para ser a segunda maior petroquímica do Brasil.

As expectativas criadas em torno da Quattor foram rapidamente minadas pela crise econômica mundial. A venda foi a saída – um negócio que rendeu R$ 700 milhões à holding Unipar e a oitava colocação no ranking das maiores fabricantes de resinas do mundo à Braskem. “Esse aumento de escala possibilita ser uma empresa global. Queremos que signifique aumento na capacidade de investimento”, explica José Sergio Gabrielli, presidente da Petrobras, que agora aumenta em pelo menos 10% sua fatia no bolo acionário da nova Braskem.

Decano da petroquímica nacional, Alberto Soares Sampaio criou a Unipar junto com Walter Moreira Salles a partir da Refinaria de Petróleo União. O primeiro pólo petroquímico do país, erguido vizinho à refinaria, era o maior patrimônio da Unipar. Por duas décadas foi comandada por Paulo Geyer, genro do fundador. Seus cinco filhos hoje dividem uma holding chamada Vila Velha, que detém 57% das ações da Unipar. Vera, Maria e Cecília não chegavam a um acordo com Alberto Geyer e Joanita sobre os rumos da empresa.

Na formação da Quattor, a Unipar juntou todos os seus ativos – que incluía a Polietilenos União, Unipar Química e participações na Rio Polímeros e PQU – com os ativos que
a Petrobras adquirira da Suzano um ano antes. Para ficar com a maioria das ações com direito a voto, a Unipar teve ainda que aportar mais R$ 380 milhões. Com menos de um ano de vida, a companhia atravessou uma crise global que derrubou a demanda por seus produtos e restringiu o crédito, e ainda viu seu plano de expansão atrasar. Diante de uma dívida de R$ 6,5 bilhões, não restava muito a fazer.

As idéias foram surgindo em seguidas reuniões desde o primeiro semestre do ano passado. Ainda que fosse o desejo da Petrobras– sócia minoritária na Quattor – uma
troca de ações com a Braskem dificilmente seria aprovada. A polêmica não estava restrita a insistência de um dos netos de Alberto Soares Sampaio – Alberto Geyer – em tentar impedir o negócio nos tribunais.

O problema era reatar uma antiga sociedade – a última experiência fora desfeita antes mesmo da criação da Braskem, quando a Unipar deu sua fatia na OPP Polietilenos em troca das ações que a Odebrecht possuía na holding. Por outro lado, uma aquisição pura e simples esbarrava num preço que a Braskem não conseguiria levantar sem multiplicar seu endividamento. Além disso, a Braskem nunca escondeu que sua prioridade era adquirir uma operação no mercado americano.

A solução foi montar uma engenharia financeira para aumentar o capital da Braskem. Odebrecht e Petrobras
aportariam suas ações na holding BRK Investimentos Petroquímicos, e logo em seguida realizariam a capitalização – Odebrecht com R$ 1 bilhão e Petrobras com R$ 2,5 bilhões. Os outros acionistas podem acompanhar esse aumento de capital com um valor entre R$ 1 bilhão e R$ 1,5 bilhão em uma oferta privada.

Após essas duas etapas a Braskem recebe da Unipar as ações da Quattor. Pelo pacote, paga R$ 647,3 milhões, assume os compromissos que a Unipar tem com o BNDESpar – estimada hoje em R$ 170 milhões – e o endividamento acumulado pela Quattor, que será abatido com o dinheiro da capitalização. Finalmente a Braskem incorporaria a fatia da Quattor em mãos da Petrobras.
Na negociação ainda foram incluídas 100% das ações da Unipar Comercial e 33% da Polibutenos, pelas quais a Braskem vai pagar R$ 52,7 milhões – a Unipar só não vendeu sua participação na Carbocloro.

Até lá, Petrobras e Odebrecht terão 120 dias para acertar todos os detalhes do novo acordo de acionistas. O presidente da Braskem, Bernardo Gradin, explica que a composição acionária final vai depender da resposta
dos acionistas minoritários – que hoje detém 1/3 das ações. Gradin permanece à frente da Braskem, “a pedido da Petrobras”, frisa o diretor executivo da Odebrecht, Newton de Souza.

Na realidade, o acordo de acionistas prevê que o presidente seja indicado pela Odebrecht. É ele quem escolherá os seis diretores estatutários – sendo que o diretor financeiro deve surgir de uma lista de nomes apresentados pela própria Odebrecht e o diretor de investimentos e portfólio ser escolhido a partir de uma lista de indicações da Petrobras. A Odebrecht terá ainda 50,1% do capital votante e seis dos onze assentos no Conselho de Administração – quatro cadeiras serão ocupadas por gente da Petrobras e uma por representante dos minoritários.

Se todos os minoritários exercerem seus direitos de preferência, a fatia da Odebrecht no capital total será de 34,5% e a Petrobras passará para 32% – se ninguém aderir, a Odebrecht manterá os 38,3% do total e a fatia da Petrobras subirá de 25,3% para 36%. Com um aporte de R$ 270 milhões, o BNDES manteria sua participação
de 5,3%. O preço de subscrição foi definido em R$ 14,40 por ação, com base na cotação média dos papéis nos
últimos pregões.

Processos de fusões e aquisições geralmente são cercados de otimismo – particularmente na aquisição da Ipiranga e na formação da Quattor, com uma boa dose de ufanismo. Dessa operação surge a maior petroquímica
do continente americano – no ranking das maiores petroquímicas do mundo, a Braskem sobe quatro degraus – serão 26 unidades espalhadas por Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Alagoas, com capacidade para processar 5,5 milhões de toneladas de resinas por ano e um faturamento de R$ 25,8 bilhões. Separadas, a receita bruta da Braskem, entre janeiro e setembro do ano passado, foi de R$ 14 bilhões, enquanto a Quattor fechou os nove primeiros meses de 2009 com uma receita de R$ 4,6 bilhões.

Gradin destaca que ainda é cedo para calcular o valor das sinergias. Apesar da supremacia no mercado interno, a Braskem não deve enfrentar dificuldades para ser aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade. A produção brasileira ainda representa 4% da oferta mundial – e 20% das resinas aqui consumidas são importadas. “Não temos uma visão de petroquímica nacional ou regional, mas global”, finaliza
Gabrielli.



Primeira operação internacional chega com
aquisição nos EUA

Dez dias depois, Bernardo Gradin se reuniu novamente com investidores, analistas e jornalistas para anunciar o primeiro movimento de expansão da Braskem: a empresa fechou a compra da Sunoco Chemicals, marcando a entrada da companhia com uma operação no mercado norte-americano. Há um ano essa era a prioridade da empresa – que chegou a conversar com outros cinco
potenciais alvos de aquisição. “Os EUA serão uma base importante na estratégia para a empresa que queremos criar até 2020”, explica o presidente da Braskem.

Mas a idéia da Petrobras é torná-la veículo de seus investimentos também no Brasil – para isso colocou em um acordo de associação a responsabilidade da Braskem sobre a parte petroquímica do Comperj e o Complexo Petroquímico de Suape. A preocupação da Braskem é que esses projetos não comprometam sua capacidade de crescimento no exterior. Somando os projetos já anunciados na
Venezuela, Peru e México, o montante ultrapassa a casa dos US$ 10 bilhões num horizonte de sete anos.

A aquisição da Sunoco Chemicals foi a primeira a ser viabilizada – não deve, no entanto, ser a única. A Braskem mantém conversações com as outras empresas, em busca de ativos que permitam ampliar a presença em solo americano. A depreciação dos ativos naquele mercado foi um grande estímulo à investida da Braskem. Por uma operação que engloba as três fábricas de polipropileno – no Texas, Pensilvânia e Virginia Ocidental – com capacidade total de 950 mil toneladas por ano, a Braskem pagará uma “bagatela” de US$ 350 milhões. O negócio corresponde a 13% da capacidade instalada de polipropileno nos EUA, e assegura também um contrato de suprimento de propeno com cinco fornecedores – entre as quais a própria Sunoco.

No encerramento do Fórum Estratégico Empresarial México-Brasil, realizado no México, a Braskem e a Idesa assinaram com a estatal mexicana Pemex os contratos de investimento e de fornecimento de etano para a implantação de um projeto integrado no Estado de Veracruz, no qual investirão US$ 2,5 bilhões. O projeto contempla a produção de um milhão de toneladas de polietilenos por ano, em três plantas de polimerização, com início de operação previsto para 2015.

Na Venezuela, em associação com a Pequiven, a Braskem desenvolve duas joint ventures orçadas em US$ 4,5 bilhões: a Propilsur, para produzir 450 mil toneladas por ano de polipropileno, e a Polimérica, para um pólo integrado 1,1 milhão de toneladas de polietileno. O projeto no Peru prevê a construção de um complexo integrado de polietilenos de 1,2 milhão de toneladas a partir de um investimento de US$ 2,5 bilhões. Nos três casos, a atratividade está na fonte de matérias-primas competitivas. O direcionamento estratégico da Braskem já está desenhado: “ser a líder das Américas e tornar-se uma das cinco maiores petroquímicas do mundo”, destacou Gabrielli.

 

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